Sunday, May 02, 2010

 

M de Maio, de Mulher, de Maria, de Mãe…


Para começar este mês de Maio, fui levada pela minha turma de meninas fantásticas a reflectir sobre o papel da mãe.

“Mãe há só uma”, diz o povo, “a biológica e mais nenhuma”, diz uma vertente da Pedagogia Sistémica, abordagem com que me identifico em muitos aspectos, mas não neste.

Mãe é a que dá vida, mas é talvez sobretudo aquela que acolhe essa vida no seu colo, que cuida, que nutre, que ama. Há a mãe que dá o seu ventre físico para a gestação, e a mãe que dá o seu coração para a criação. E nem sempre as duas estão numa.

A mãe biológica dá a vida, ninguém lhe pode negar esse papel, mas a mãe afectiva permite manter essa vida, cuidá-la, nutri-la, ajudá-la a desenvolver-se, a fortalecer-se, a desabrochar. Sem a primeira não estaríamos cá, sem a segunda não teríamos sobrevivido.

E o papel de mãe não é necessariamente desempenhado pela mãe, avó, tia, madrinha, o que for, o papel de mãe, o de quem dá atenção, apoio, amor, carinho, segurança, etc., pode ser desempenhado pelo pai, o avô, um irmão, a enfermeira, a vizinha…

Parte-se do princípio de que a mãe biológica tem de fazer o papel de mãe, doa por onde doer, aconteça o que acontecer, tenha ou não tenha vontade, capacidade, força, competência, etc., para o fazer. Mas parte-se de um princípio que na prática nem sempre se cumpre. Há muitas circunstâncias que podem levar a que uma mãe não possa desempenhar para o seu filho o papel que à partida lhe estaria designado. Não por escolha, não por sovinice de não querer dar o seu colo e o seu amor, mas por incapacidade.

Pode por incapacidade não dar a presença física, por incapacidade não dar a presença emocional, e mesmo estando não está… Mas às vezes optar pelo afastamento em vez da presença pode ser um sacrifício de amor maior… quando a mãe sente, intuitivamente, que o que tem para dar não é luminoso e nutridor, que pode ser mais prejudicial do que benéfico. E sentindo isto, ainda que inconscientemente, dá ao seu filho a possibilidade de ser cuidado por outros que lhe tragam maior bem, outros que desempenharão o seu papel de forma positiva.

E na muito frequente hipótese de não termos recebido todo o amor e apoio de que necessitávamos (ou julgávamos que necessitávamos), a minha teoria é de que a única solução, a cura para os nossos males, tristezas e carências internos, não passa por lamentações ou vitimizações ou por procurar quem nos cure as feridas mas passa por algumas consciencializações fundamentais:
a) A mãe fez o melhor que podia com as circunstâncias que tinha, não fez mais e melhor porque não soube ou não pôde;
b) O facto de a mãe não ter estado, feito, dado o que nós gostaríamos não é culpa nossa, falha nossa ou falta de merecimento nosso, é incapacidade dela;
c) As condições em que nascemos e crescemos não são obra do acaso, têm um propósito, normalmente servem para desenvolvermos capacidades fundamentais em nós.

Então, neste caso, a solução é aprendermos a ser a nossa própria mãe. Darmo-nos a nós próprios o que gostaríamos que nos tivessem dado, encher o nosso reservatório que possa estar deficitário. Dar colinho a mim, amor a mim… porque só assim eu saberei e conseguirei dar amor a outro (ao filho, ao marido, à vizinha, à Humanidade…).

As nossas mães não supriram todas as nossas carências? Perdoemos-lhes (se é que se pode aplicar o termo), não foi por mal nem por escolha, simplesmente não souberam ou não conseguiram fazer melhor.

A mãe não foi verdadeiramente mãe? Tudo bem, alguém numa primeira fase da vida a terá substituído e terá cumprido esse papel. Esse papel também não foi bem cumprido? OK, vou eu cumpri-lo. E aqui não há desculpas, se eu não cumprir sou eu que estou em falta para comigo, não outro. Em última instância, todos nós nascemos e morremos sozinhos, pelo meio vamos desejando que alguém nos faça companhia, cuide de nós e nos dê amor, mas talvez a aprendizagem mais importante da nossa vida seja a de que somos nós os responsáveis por nutrir as nossas carências. Sou eu que tenho de dar a mim aquilo de que necessito. Com que legitimidade posso eu pedir a alguém (mãe, marido, o gato…) que me dê o amor que eu não sei dar a mim próprio? Com que base, fundamento, experiência, capacidade, posso eu dar amor a outro se não o sei dar a mim?

A mãe não fez porque não sabia como, também ninguém o fez com ela, nem com a mãe dela… Um ciclo que precisa de ser quebrado. Por nós. Agora.

Não podemos mudar o passado, nem podemos mudar as outras pessoas, mas podemos agir sobre o presente e sobre nós mesmos. Se eu assumir a responsabilidade por mim mesmo, se eu me der aquilo de que preciso, não fico dependente, nem frustrado, nem carente, fico bem e em condições de distribuir, a mim e aos outros.

Moral da história e apelo à acção urgente: Seja a sua própria mãe!

Neste desvio não programado mas muito pertinente, outras questões foram debatidas, surgiram reflexões, emoções, compreensões e talvez outros ões… E eu agradeço às minhas meninas pelo momento profundo e enriquecedor que partilhámos.


(Imagem 1: The Three Ages of Woman (detail), Gustav Klimt
Imagem 2: Jesus and Mary, Daniel Rodgers
Imagem 3: Mother Teresa, Jerry Breen)

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