Tuesday, May 15, 2007

 

Diário de uma flor silvestre




Local: um campo, entre tantos campos
Data: uma Primavera, como tantas outras


Hoje esteve um dia bom. Cheio de sol. Cheio de aromas primaveris. Cheio de chilreios felizes… mesmo como eu gosto.

Mas no meio desta alegria geral, uma tristeza: uma despedida, abrupta, involuntária, algo agressiva.

Estávamos nós numa paz tranquila e amena, a saborear a nossa existência, quando apareceu uma figura humana, resoluta e apressada, olhando para um lado e para o outro, como se estivesse à procura de alguma coisa. E estava, ao que parece. Estava à procura de flores cuja vida bela e frágil pudesse ceifar. Não com sensibilidade e reverência como quem sabe apreciar a ternura de uma flor e a quer levar para presentear a pessoa amada, mas com indiferença e descaso, revelando a sensibilidade de uma retroescavadora.

E lá se foram, deste modo pouco digno, alguns dos meus companheiros, malmequeres e papoilas.

Foi uma cena triste. Senti o desrespeito com que eram tratados como se fosse no meu próprio caule, nas minhas próprias pétalas. E senti o desespero da impotência de nada poder fazer. Ainda lhe gritei, esfacelei a voz a tentar chegar àquela pedra humana, mas nada consegui. Restou-me apenas a revolta. E depois da revolta a resignação. E depois da resignação a aceitação. E depois da aceitação a aprendizagem. E depois da aprendizagem o crescimento e a paz.

Percebi que a vida é cíclica, que tudo o que nasce também morre e que tudo o que morre virá a renascer, para um novo ciclo, numa forma mais avançada.

Percebi que a morte (qualquer que ela seja) não é um fim mas um novo princípio, uma nova oportunidade de crescer e evoluir.

Percebi que o que verdadeiramente importa na nossa vida não é quando ou como acaba mas a forma como foi vivida.

Percebi que nem sempre as pessoas são como nós gostaríamos que elas fossem mas que temos de as aceitar como são, porque o seu percurso está, de alguma forma, ligado ao nosso e não foi por acaso que as atraímos, alguma coisa temos de aprender com elas, se não mais pelo menos a aceitação e a convivência pacífica com a diferença.


E pronto, por hoje chega de emoções e aprendizagens.
Amanhã é um novo dia. Vou tentar valorizá-lo o mais possível, vivê-lo como se fosse o último (nunca se sabe quando será), saboreá-lo intensamente, e quando chegar o meu momento irei com a paz, a felicidade, a realização, de quem viveu plenamente cada um dos dias que recebeu de presente.

(Imagem: Fotografia Olga Correia)

Comments:
Olá amiga Olga! Há quanto tempo...

Antes de mais, agradeço-te imenso teres passado pelo meu blogue, mesmo que ele pouco tenha a ver com os assuntos do teu e com as "conversas" que aqui temos tido.

Mas, como certamente te apercebeste, trata-se de um blogue mais ou menos temático, em que eu não sou a única interessada. Foi uma brincadeira, para ver um pouco as reacções ao nosso "artesanato".
No entanto, acho que está presente algo para além do simples aspecto terra-a-terra, já que fazemos aqueles trabalhitos com amor e o melhor que sabemos: creio haver nisso alguma forma de elevação espiritual (para o meu/nosso nível, claro).
Além disso, procuro acrescentar poemas ou pequenos textos com algumas mensagens que façam reflectir ou sentir alguma paz (embora "levezinhos").
E sempre que posso vou deixando comentários mais sérios em outros blogues.

Bem, mas não devia estar aqui a falar de mim e sim a comentar o teu texto (desculpa).

Como sempre, trazes assuntos de grande profundidade, para reflectir a sério.
Mostras também a tua enorme sensibilidade ao falares dos malmequeres e papoilas como teus companheiros, cujo corte abrupto te entristece.
Que fantástico seria se todos desenvolvêssemos essa sensibilidade!
Mas não ficas por aí e percorres o ciclo das emoções humanas até culminar na aprendizagem e crescimento, que deveríamos extrair de qualquer acontecimento.
Acho também muito válida a noção de que temos algo a aprender mesmo com as pessoas muito diferentes de nós. Não deve ser por acaso que estamos neste mundo todos misturados e ao mesmo tempo.

E finalmente, a ideia que é preciso viver cada dia como se fosse o último.
É praticamente um programa de vida, que fizeste numa única postagem.

Beijinhos e até um dia destes.

P.S.: Tenho uma ligação para mail no meu blogue, se alguma vez preferires uma conversa mais pessoal.
 
Margri:
Tens razão, tenho andado meio desaparecida... São fases.

Sabes que também já pensei fazer um blog do género do teu? Pois é. Mas ainda não chegou a hora. É que eu também gosto muito de artesanato. Faço umas brincadeiras com telas, faço os meus cadernos, bijuteria e outras coisitas, mas acho que o que eu faço melhor são mesmo as velas e os sabonetes. Dão-me um prazer enorme e também são formas de eu transmitir energia positiva às pessoas.

E claro que podes falar de ti, ou do que te apetecer, considera mi casa também tu casa ;)

Obrigada pelos teus comentários aos meus textos, é sempre muito gratificante termos o feedback sobre a forma como são recebidos e interpretados pelas outras pessoas.

Quanto ao email, agradeço a ideia e até te deixo o meu se o quiseres utilizar (olgacorreia32@hotmail.com) mas, na verdade, não me importo nada de ter estas conversas aqui mesmo, quem sabe se não poderão ajudar mais alguém a reflectir... ou não... mas pelo menos alimenta-se essa possibilidade.

E a propósito de reflexões, não sei se te apercebeste de que te deixei resposta ao teu comentário na carta do Gervásio...

:)
 
Claro que vi a tua resposta no outro post. Só que o assunto é tão complexo e tem tantas vertentes, que nunca mais acabaríamos de o discutir. E no essencial estou de acordo contigo.

Quanto à divulgação do teu artesanato, acho que podia ser uma ideia interessante.

Eu estou a gostar de fazer esta partilha, e de , ao mesmo tempo, receber algum "feedback".
E como escolhi a forma e o espírito de "bric-à-brac", faço uma mistura completamente informal de artesanato e textos, que é um pouco o reflexo da minha personalidade, algo dispersa.

Beijinhos.
 
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