Thursday, June 21, 2007

 

Subir e descer




Houve um tempo em que achei que havia muita gente a fixar-se obsessiva e cegamente nesta ou naquela teoria esotérica, nesta ou naquela vertente mística ou religiosa e a deixar-se escravizar por determinados “mestres” ou linguagens, da velha ou da nova era,… a ficar encantada com alguns discursos que bem espremidinhos não diziam grande coisa (na minha perspectiva, claro, mas quem sou eu?!?...), a criarem heróis e salvadores e gurus a quem se colam como lapas, e a quem veneram inquestionavelmente, seguindo credos e lemas que não nasceram dos seus corações nem das suas almas.

E isto preocupava-me, apetecia-me abaná-los e dizer-lhes que assim se perdiam em vez de se encontrarem, porque o verdadeiro crescimento espiritual implica total liberdade interior, a capacidade de obedecer apenas às leis divinas e cósmicas, às do coração e da consciência, e essas nem sempre têm a ver com as leis dos homens, sociais ou religiosas ou outras quaisquer.

Mas depois percebi que esse talvez fosse um percurso necessário. É preciso fazer o caminho da subida, em direcção ao alto (e às vezes nesse processo pode-se ficar agarrado, esperemos que por pouco tempo, a alguns dos degraus), antes de poder fazer o caminho de regresso. É preciso ir à fonte buscar água para depois voltar e regar o jardim. Porque ir à fonte é absolutamente fundamental, mas ficar na fonte e desligado do resto, já não. É preciso voltar com a água vivificadora e aplicá-la na terra. Se ficarmos parados na fonte e nos esquecermos completamente do jardim o mais natural é que o deixemos secar, e não é esse o objectivo. A nossa missão é manter o jardim (ou a horta, ou o mundo…) saudável e belo, cheio de aromas e cores, bem hidratado e nutrido. No fundo, cheio de luz.

Subir é muito bom, diria até obrigatório, mas ficar por lá não, não nesta fase, não quando temos um mundo à nossa espera e à nossa responsabilidade. É preciso subir e descer, mantendo sempre a ligação entre os dois níveis. Identificar a verdade maior mas depois vir pô-la em prática.

Nesta sequência concluí que talvez estivesse a exigir de mais, queria que quem ainda está a subir (a consciencializar, a interiorizar, …) já estivesse a descer (a sentir, a viver, a praticar de acordo com a verdade consciencializada), queria que quem ainda está a caminho do céu já estivesse de regresso e a trazê-lo para a terra.

Tenho de ser mais paciente.
E, sim, eu sei que cada um deve responsabilizar-se pelo seu próprio percurso, mas ainda não consegui deixar de me preocupar com o caminho do colectivo e do universo.


(Imagem: Hans-werner Sahm, Vision)

Comments:
Gostei muito do post, a comparação da evoluçao espiritual com a ida à fonte e o regar do jardim é excelente.

carlos
 
Um post excelente.
Concordo inteiramente e agradeço.
Bem hajas!
Um beijinho
 
Há um subir com os pés ou com as asas. Há um descer à terra, ao jardim, ao mundo... Mas se, nesse descer, houver uma queda? Que fazer para guardar a água que havíamos encontrado lá em cima?

Beijinhos
 
Carlos e anónimo:

Obrigada!
:)
 
Mofina Mendes:

“Há um subir com os pés ou com as asas”, ou de joelhos ou de rastos… ou com o coração ou com a mente… Cada um vai fazendo a subida como pode, com a abertura que consegue, com a aprendizagem que vai fazendo…

“Mas se, nesse descer, houver uma queda?” Nesse caso, porque os percursos não são todos lineares, em linha recta e sem atropelos, e porque os obstáculos fazem parte do caminho e do processo de crescimento, é preciso aceitar a queda, não se culpabilizar, aprender com ela, levantar-se e recomeçar o caminho, com certeza com muito mais força e luz.

“Que fazer para guardar a água que havíamos encontrado lá em cima?” A água que se encontra lá em cima não se perde. Porque o que é fantástico nos seres humanos é que esta “água” que se traz lá de cima não vem em recipientes que se possam quebrar e verter ao sofrer um queda, este alimento vital é colocado em reservatórios à prova de queda: no coração e na alma. Por isso, por mais quedas que se possam dar, aquilo que se trouxe lá de cima não se pode perder, fica gravado nas células, mesmo que nem sempre tenhamos consciência disso. Assim sendo, não é preciso preocuparmo-nos se perdemos a água, ou como havemos de a guardar… ela não se perde e guarda-se sozinha. Podemos, no entanto, querer aumentar o volume da “vasilha” com que se busca essa água para poder recolher cada vez mais, podemos querer aumentar a frequência com que a buscamos,… enfim, podemos aumentá-la, aprofundá-la, mantermo-nos sempre ligados a ela, ter cada vez mais consciência dela, usá-la para hidratar e alimentar cada vez mais hortas e jardins… mas perdê-la já não. Faz parte de nós.

:)
 
Gostei...

Obrigada e um beijinho.
 
O pior é quando se sobe sem preocupação com os que ficam cá em "baixo". Fazes bem, quer em ser tolerante quer em te preocupares com os demais.

Uma beijoca e obrigado pela visita!
 
Oi olga, vim aqui pq me disseram q tu eras umas grande mulher ....
Sabes concordo plenamente ctg ... As vezes vejo blogs, demasiadamente cosmos , para o mundo que vivemos... A falar demasiado na no todo , quando estamos a trabalhar na unidade, devemos ir a fonte mas de vez enquando descer, sem duvida....
Porque se estamos neste mundo é por alg razão pq estar sempre a fugir... será que assim tb não estamos a fugir da nossa escolha de evolução ...?? bjinhos
 
Mofina Mendes:

Ainda bem. ;)
 
Rafeiro Perfumado:

Pois… Na minha perspectiva “subir” sem se preocupar com o que acontece aos outros não é uma verdadeira subida, não é a verdadeira evolução espiritual. Porque fazemos todos parte de um todo, se os outros estiverem mal eu dificilmente poderei estar bem. E embora seja verdade que cada um tem de começar por se curar a si mesmo, por encontrar as suas próprias respostas e o seu caminho, penso que a segunda fase desse processo (ou até ainda mais ou menos simultânea) passa por querermos que todos “subam”, que todos estejam bem, passa por nos disponibilizarmos para fazer tudo o que pudermos para os ajudar a encontrar-se, a curar-se, a serem felizes, a encontrarem a plena realização…
E mesmo que quisesse deixar de me preocupar com os outros não conseguiria, como diria o caranguejo, “está na minha natureza”.

:)
 
Estrela:

“As vezes vejo blogs, demasiadamente cosmos , para o mundo que vivemos...” Tens razão, há realmente muitos blogs assim, como há muitos outros discursos, textos, livros… enfim. E até acho que esse é um percurso necessário, faz parte da subida, mas não se pode ficar por aí. É preciso que depois disso duas coisas se consigam fazer: por um lado pôr em prática, na vivência do dia-a-dia, as noções teoricamente expostas; por outro tentar fazer chegar a mensagem aos outros, e isso implica predisposição interior, predisposição para a dádiva, predisposição para criar empatia, para tentar entender o outro e ver o que o amedronta e motiva, etc., etc., etc.,. (e isto também é vir descer à terra e regar o jardim). É uma grande trabalheira, como se pressente, mas de que adianta se assim não for?

“Porque se estamos neste mundo é por alg razão pq estar sempre a fugir... será que assim tb não estamos a fugir da nossa escolha de evolução ...??”
Mais uma vez tens toda a razão. Se o objectivo da nossa vida fosse viver meramente no plano espiritual não faria sentido termos vindo para a matéria. Na minha perspectiva o nosso trabalho passa pela espiritualização da matéria, ou pela materialização do espírito, enfim, pela harmonização destas duas fundamentais vertentes da nossa vida. Fugir a qualquer uma das duas é, como tu dizes, fugir ao nosso propósito evolutivo.

Quanta à questão da “grande mulher” é muita simpatia vossa, mas não sei se quem o disse sabe que eu não vou muito além do metro e meio… ;)

:)
 
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